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1 de agosto de 2014
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Contos do corpo, 12 – A puxadinha

Ficou decidido que eu teria de usar aparelhos ortodônticos. Muitas colegas da escola usavam. Disseram que era para o meu próprio bem. Topei. Não que minha opinião fosse alterar alguma coisa.

O primeiro passo era puxar meus dentes para trás.

– Tudo bem.

Da maneira como o dentista falava, parecia que ia puxar um fio de cabelo que estava fora de lugar.

Falou que ia colocar dois ganchinhos nos dentes de trás, para encaixar o aparelho. Apenas nos dentes de trás. Achei ótimo. Ia ser um lance sutil. Ele falou que ia usar uma colinha.

– Tudo bem.

Eu acreditava em tudo que ele dizia.

O dentista pegou uma furadeira. Deve ter esquecido da colinha, no diminutivo. Eu me agarrava à cadeira e rezava. Ele era adulto. Um profissional. Eu queria, do fundo do coração, confiar no dentista.

Depois abriu uma gavetinha, pegou um arco de metal e meteu na minha boca. Tirou, fez algumas medições e começou a trabalhar no arco, com um alicate. Parecia que estava fazendo uma escultura. Ele puxou minha cabeça e mediu minha nuca. Seguiu trabalhando. Ele era meio bonito. Fiquei ali deitada, mais tranquila porque a dor tinha passado e eu já não precisava abrir a boca.

– Prontinho!

Então ele botou um cabresto em mim. O aro saía da minha boca e enganchava atrás das minhas orelhas através de uma banda de elástico que ficava preso à minha nuca.

– Vai ficar assim? – perguntei, ingenuamente.

Não. Ainda faltava um detalhe. Ele tinha de apertar.

Apertou. Nesse momento eu entendi o que ele quis dizer por “puxar meus dentes para trás”. Era no muque mesmo. Puxou sem dó.

– Eles vão querer voltar pro lugar – ele explicou – ainda puxando com as duas mãos, como quem segura um touro.

Ele suava em bicas.

– Por isso temos de prendê-los. O ferro impede que voltem pro lugar.

Ele enganchou as pontas do arco na banda elástica atrás da minha nuca. Meus dentes eram dois rottweilers. Não estavam nada felizes. Mas eles ficariam presos.

– Você só vai tirar pra comer e escovar os dentes.

Assenti. Não tive coragem de abrir a boca e falar.

–  Daqui uma semana você não vai sentir mais nada.

Assenti.

– Alguma pergunta?

Fiz que não. Pensei em perguntar como ia ser minha vida dali para frente, mas desisti.

– Então pode ir.

Levantei da cadeira e saí andando, com a tranca nos meus dentes, o pescoço duro, me esforçando para não chorar.

Era para o meu próprio bem.

 
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4 comentários

  1. Avatar
    tatiana

    Oi Indigo!!! Desculpa postar aqui meu comentario sobre o Livro é que travou quando eu estava postando no “Fale que eu te escuto”. Terminei de ler “Um Dálmata descontrolado” e fiquei impressionada com a riqueza da história. O livro trata de diversos assuntos que podem ser desdobrados em sala de aula ou até mesmo em família. A questão referente a amizade e o amor pelos avós e com os animais. O respeito a diversidade….enfim. Mais o que me chamou muito a atenção foi a questão da ligada a página 165, “Plano de educação Estudantil por Estímulo Positivo”. Sem palavras, simplesmente perfeito para professores que adoram punir alunos e não sabem olhar e compreender o que os alunos trazem de bom, o quanto tem a nos oferecer e o quanto temos que aprender com cada um deles. Ler seus livros já virou um vicio saudavel em minha vida. Fico imaginando : que livro leio agora? O que sera que vou aprender? Para que lugar a Indigo me levara em sua próxima aventura? São tantas as perguntas, são tantas as aventuras…que minha imaginação vai sempre além. Parabéns pelo livro, simplesmente apaixonante.

    1. Avatar

      Oi, Tatiana. MUITO OBRIGADA pelo comentário. É exatamente o que eu estava precisando ouvir no meio de um dia beeeem complicado. beijinho, Índigo

  2. Avatar
    tatiana

    Caracas que bom este conto. Nunca coloquei aparelho nos dentes e agora fiquei pensando como meu filho sofre com o tal aparelho e coitadinho dos dentes pressos kkkkkkk. Tem muitas coisas que são para nosso próprio bem, mas que nos fazem tão mau né? Por exemplo…..é para meu próprio bem que preciso lavar roupa toda semana, preciso limpar a casa e me estressar lavando calçada e cortando grama…depois fico quebrada, nervosa, toda doida e de pessimo humor….mais é para o meu bem….vá entender.

    1. Avatar

      Cuidado com esse para o próprio bem… É uma pegadinha e a gente tem a tendência de cair, feito patas… bjo

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