Medo, muito medo
A caverna era composta por um salão que dava acesso a sete túneis diferentes. Graças a Deus tive a esperteza de identificar o túnel pelo qual havia chegado ali. Assim que percebi a pegadinha, arranquei os sapatos e os deixei em frente à entrada do “meu” túnel. No meio do salão havia uma fogueira e do teto pendia um caldeirão. Dentro borbulhava um líquido verde e viscoso. O cheiro não era ruim. Lembrava uma mistura de café, madeira queimada e grama cortada. Nas paredes, vários ganchinhos com ervas desidratadas, pedaços de cipó, capim, tranças de alho e inúmeros tipos de pimenta. Também havia uma prateleira de vidros de maionese com cobras enroladas dentro, as velhas cobras em compota. Adoro esses vidros. Mais um elemento que sempre insiro nas minhas histórias e agora lá estava, ao vivo e a cores. A diferença é que, nesse caso, as cobras não estavam mortas. Quando me aproximei, uma cobra coral se contorceu inteira e virou a cabeça em minha direção. Botou a língua para fora e sussurrou um negócio que entendi perfeitamente, como se ela estivesse falando em Português. Disse:
“Me tira daqui!”
Dei um passo para trás. Morro de medo de cobra.
“Você ouviu o que eu falei?”
“Não posso.”
“Ninguém vai saber.”
“Tenho medo.”
“Medo do quê?”
“De levar uma picada.”
“Juro que não vou te picar.”
Mas eu não conseguiria pegar no vidro. Saí andando para trás. Fiquei tão apavorada, que não consegui nem dar as costas para ela, com medo que se atirasse em cima de mim, sei lá.
“Volta aqui! Eu quero falar com você.”
Mas a essa altura eu já estava correndo escada acima, gritando por Morgana e implorando para que abrisse a porta do armário.