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7 de agosto de 2014
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Contos do corpo, 15 – Meus cabelos (a primeira mutação)

Nessa época meus cabelos passaram por uma mutação tão assustadora que eu me recusava a creditar no que estava vendo.

Começou quando tive a brilhante ideia de cortá-los, uma semana depois de ter colocado o cabresto. Escolhi o corte da Jackie Onassis. Fiquei a cara do Cauby Peixoto. Do nada, ele começou a enrolar como se tivesse vida própria. A força da gravidade não chegava até os fios. Eles viravam para cima, para o horizonte e em torno do próprio eixo. Faziam voltas estrambóticas, qualquer coisa menos pender para baixo, como um fio de cabelo normal.  

Eu escovava com fúria. Eles revidavam no ato. Se eu desmanchava um cacho, o cabelo formava tufos de fios arrepiados, quase histéricos.

Eu parava na frente da minha mãe, apontava para a minha cabeça, como quem pede uma explicação para aquilo.

–              É a umidade – ela dizia.

Agora eu seria refém do indício pluviométrico?

Pelo jeito, sim. Apelei para presilhas, grampos, tiara, elástico. Prendia tudo. Enquanto meu cabelo não aprendesse a se comportar, não ia ficar solto. Vivíamos de mal.

Havia dias em que ele acordava um pouco mais manso. Em vez de cachos irados, formava ondas. Eu tinha até medo de pentear e, sem querer, ofendê-lo. Apenas dava uma ajeitadinha com as pontas dos dedos e ia para a escola, cheia de esperança de que a vida estava me dando uma trégua. Mas, do nada, por causa de um vento, uma garoa, a aula de Educação Física, qualquer coisa, os cachos voltavam com força redobrada. Quando eu menos percebia, tudo tinha mudado. Aprendi a andar com um monte de grampos e elásticos no bolso do uniforme, o tempo inteiro.

Também havia dias em que, simplesmente por ficar debaixo do sol, ele murchava a ponto de ficar liso. Eu olhava no espelho e não entendia nada. Ficava tão jeitoso, igualzinho eu tinha imaginado quando cheguei no cabeleireiro com a foto da Jackie Onassis. Era uma foto em que ela estava de óculos escuro, vestido cor de rosa, luvas brancas e um casaco de oncinha por cima. Sei lá, me identifiquei.

Nos dias lisos, era como se ele quisesse me passar um recado. Ele era capaz de tudo. Era crespo, ondulado, liso, rebelde, jeitoso, camarada ou indomável. Ele não seria escravo das minhas vontades. Eu deveria aprender a aceitar o que ele podia oferecer naquele dia específico e não lutar contra sua pré-disposição.

Dizer que ele era reflexo do meu humor é querer fazer poesia.

Ele era muito mais que isso. Ele era a causa de tudo de bom ou ruim que acontecia no meu dia.

 
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